sábado, maio 16

As gavetas


Não deves abrir as gavetas

fechadas: por alguma razão as trancaram,

e teres descoberto agora

a chave é um acaso que podes ignorar.

Dentro das gavetas sabes o que encontras:

mentiras. Muitas mentiras de papel,

fotografias, objectos.

Dentro das gavetas está a imperfeição

do mundo, a inalterável imperfeição,

a mágoa com que repetidamente te desiludes.

As gavetas foram sendo preenchidas

por gente tão fraca como tu

e foram fechadas por alguém mais sábio que tu.

Há um mês ou um século, não importa.
Pedro Mexia, in Anos 90 e Agora, pag. 215, Quasi, 2001
imagem: desenho de Salvador Dali

Desculpa-me

Claudinha: DESCULPA-ME!!!!!!!!
Não podia ter-me esquecido do teu aniversário! Estou mesmo envergonhada :( e triste!

A vida nunca é uma via rápida


Mais uma sessão de home cinema! Sofá e manta! Que volta a fazer frio! Chama-se Elizabethtown. E como o meu querido Miguel escreveu um dia «é um filme acima do céu porque mostra, de uma forma absolutamente tocante, que a vida nunca é uma via rápida. É feita de estradas secundárias, caminhos imprevistos, apeadeiros...» E é o que me está mesmo a apetecer. Com chá e bolachas. E tudo muito quieto. E a luz apagada. E mais nada. Que o filme vai começar.

Eu parei no mail...


...e nem devia ter começado! Compreendem, agora? :)

sexta-feira, maio 15

a noite pede música





Coincidências! Eu ali parada a olhar para o título! O título ali parado, a olhar para mim! Enfim! Coisas estranhas! Win some, lose some. E depois, sem esforço, a letra nos lábios «She touched my face and called me her lover/I never thought that I'd need another». Aos anos que não ouvia isto! Ele há - como direi? - não direi! Porque eu hoje, não direi nada de jeito... se abrir a boca! Ora ouçam!

SIM

Sim, quero dizer sim ao inacabado


que é o princípio de tudo

e o que não é ainda,

sim ao vazio coração que ignora

e que no silêncio preserva o sim do início,

sim a algumas palavras que são nuvens

brancas e deslizam amplas

sobre um mundo pacífico,

sim aos instrumentos simples

da cozinha,

sim à liberdade do fogo

que adensa o vigor da consciência,

sim à transparência que não exalta

mas decanta o vinho da pesença,

sim à paixão que é um ajuste ao cimo

de uma profunda arquitectura íntima,

sim à pupila já madura

que se inebria das sombras das figuras,

sim à solidão quando ela é branca

e desenha a matéria cristalina,

sim às folhas que oscilam e brilham

ao subtil sopro de uma brisa,

sim ao espaço da casa, à sua música

entre o sono e a lucidez, que apazigua,

sim aos exercícios pacientes

em que a claridade pousa no vagar que a pensa,

sim à ternura no centro da clareira

tremendo como uma lâmpada sem sombra,

sim a ti, tempestade que iluminas

um país de ausência,

sim a ti, quase monótona, quase nula

mas que és como o vento insubornável,

sim a ti, que és nada e atravessas tudo

e és o sangue secreto do poema.

António Ramos Rosa
[de No Calcanhar do Vento, 1987] in Os Quatro Elementos, pag. 39, ASA, 2004

imagem: pintura de Magritte

Um bilhete para qualquer lado

Ontem, a minha versão masculina dizia-me que há momentos em que só é preciso ter um bilhete para qualquer lado! Qualquer lado parece-me o lugar ideal! [E as férias aproximam-se!] Aliás, qualquer lado, é o melhor lugar do mundo!

Coisas que combinam comigo

Mesmo à porta do Verão, a minha dúvida mantêm-se. Nunca se dissipa. Um tormento. Muito pouco sério, é certo. Mas um tormento! Sapatos ou botas? Botas ou sapatos? Que às vezes é preciso determo-nos em questões divertidas, superficiais, inofensivas, parvas, descontraídas! A vida são quantos dias? E este já entra na conta, não é?

quinta-feira, maio 14

a noite pede música

Qual é a aldeia da sua vida?

A ideia é da Susana e parece-me muito boa! Tem o mérito de divulgar as aldeias portuguesas.
A Susana apela a uma blogagem colectiva no intuito de cada um escrever sobre a aldeia da sua vida. Há um prémio. Terá de haver uma inscrição prévia. E há datas a cumprir. Por isso, muita atenção. O melhor é espreitarem o blog da Susana. Ela explica. Tim tim por tim tim. Participem! Divulguem. Contem-nos tudo sobre a aldeia da vossa vida! E habilitem-se a ganhar um fim-de-semana em Monsanto, a Aldeia mais Portuguesa de Portugal!

quarta-feira, maio 13

Deve ter 237 anos [III]

[...] Depois de ter estudado bem todas as gerações de palavras que o habitam, o adivinhador de passados, disse-me que tinha encontrado a solução. Desabraçar. Essa era a palavra para que jamais voltasse a dar um abraço inventado, numa pessoa inventada. E eu disse-lhe que isso era impossível, porque nunca tinha inventado um desabraço. E que me parecia absurdo. E que nem sequer nunca tinha visto ninguém desabraçar alguém. E ele riu-se. E autorizou-me a procurar a palavra para que acreditasse. E garantiu-me que só um beijo inventado não tinha solução. Porque a palavra desbeijar não existe. E perguntou-me se algum dia eu tinha dado um beijo inventado numa pessoa inventada. E disse-lhe que, antes de mais, ia procurar a palavra desabraçar. Desabonar; desabono; desabordar; desaborrecer; desabotoadura...[cont.]

O amor tornou-se uma questão prática


«[...] O amor tornou-se uma questão prática. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas. Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço. Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo? O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida,o nosso "dá lá um jeitinho sentimental".
Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade.
Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como nãopode. Tanto faz. É uma questão de azar.O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor. A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio,não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe. Não é para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende.


Miguel Esteves Cardoso, Excerto do texto Elogio ao Amor
[este texto é conhecido universalmente. e se não é, devia ser! MEC no seu melhor! Mas, como diz o editor da nova revista, todos nós já o recebemos, repetidas vezes, por e-mail! ao abrir a revista do i, no passado sábado, ei-lo a celebrar o tema da capa! Adorei a publicação e, apesar de não ter onde as arrumar, vou coleccionar as 50!]

Assim

Há desertos, assim, nas palmas das mãos que nunca se fecham.

A noite vai pedir música

Eu não imaginava o "meu" Rui Veloso a cantar isto! Num dueto com Leila Pinheiro!Digo isto, para não dizer mais nada! E como tudo o que eu possa dizer sobre isto, nunca será fiel ao que sinto, dedico esta música à Leonor. Porque ela sabe ler o meu silêncio. E a minha felicidade ao dar de caras com esta música, numa versão que eu nunca tinha ouvido antes!

[...e porque um dia me escreveste que «a saudade é a memória do coração»]

Roubado aqui! Com vénia ao Passos!

Da importância de por paixão no que se faz

Mais mimo blogosférico


Mais uma vez não cumpro as regras! Mas agradeço. Muito! Agradeço ao Whesley e à Isabel. Muito obrigada pela gentileza! E como não vou cumprir as regras, porque é difícil escolher eu ofereço os selos a todos os blogs que visito! [Isabel, minha querida, quanto a cinco coisas que eu adoro: amigos/família; escrever;viajar;ler; cozinhar :)]

segunda-feira, maio 11

A tabela a loba e eu

Eu nunca fui uma aluna brilhante. Muito menos no secundário. As minhas notas iam do 19 ao nove. Tinha um pouco de tudo. Só estudava o que gostava. E nem era bem estudar. Era ler a matéria e tirar notas que acabava sempre por perder. Os cadernos eram verdadeiros tratados observacionais-poéticos, com sumários pelo meio. Uma desgraça! Nessa altura a única coisa que me brilhava, eram os olhos. Na leitura dos poemas. E no caminho para a biblioteca. E quando via o Filipe. Concedo. Mas dizia eu que não fui uma aluna brilhante. E quando digo brilhante, digo constante. Com método. Ou seja, com boas notas a tudo. Como a Leonor , por exemplo. Que tanto admirava. E admiro. Felizmente, ainda está na minha vida. Constantes. Como as notas dela. Eu era aquele tipo de aluna [quando tiver filhos apago o blog] que passava os dias encafuada em leituras, que ninguém me pedia. Passava as aulas de Matemática e de Físico-Química a escrevinhar e a anotar as palavras novas, que os professores iam dizendo. A professora de físico-química, por exemplo, passava os dias a dizer a palavra análogo. E era um tanto distraída com as experiências. Aquilo quase nunca corria bem. Uma vez, a colher de combustão derreteu. Excesso de química! Talvez por isso, eu gostasse tanto dela. Afinidades. Mas era a tabela periódica a única coisa a fascinar-me, naquelas aulas. E lá ia eu à procura do inventor da Tabela e da sua história.Coisas que não interessavam para o caso. Nem nunca a pergunta saiu no teste. Obviamente! Depois, perdia tempo infinito à volta dos nomes dos elementos da Tabela. Quanto mais estranhos, mais me seduziam. E lá me punha a escrever e a descrever personagens com nomes tipo manganês, cádmio, ósmio, dúbuio, actínio. Enfim, fazia dos metais e não-metais verdadeiros heróis! Nem o bronze, a prata e o ouro escapavam a um papel secundário! De acordo com as suas características. Sabia-ás de cor e salteado, como nunca soube a tabuada!
A tabela periódica ajudou-me a compreender a composição do mundo. Até do amor. Da química e da falta dela. E os alquimistas conquistaram-me para sempre. Mas nada disto me foi alguma vez perguntado no teste de físico-química. Daí os apontamentos marginais, no miolo dos cadernos. Ninguém os entendia. Só eu. Eram de uma inutilidade tremenda.
Entre as aulas onde, de facto, eu estava em tempo real, ou seja, sintonizada com o professor, contava-se a de História. Nas aulas de História, eu não precisava ir atrás da história. Era a História que vinha atrás de mim. E eu à frente. Por vezes. Com devoção. Sumérios, fenícios, cartagineses. Ainda hoje sei o nome do rei da Suméria e qual a função do patési. Detive-me na escrita cuneiforme difundida por toda a Mesopotâmia. Nos pictogramas que, depois, os fenícios passaram a alfabeto fonético, com 22 letras. Antes do nosso.
Depois, Roma, Grécia. O tanto que me apaixonei por elas, ali, nas páginas dos manuais. O tanto que as imaginei. O tanto que me fizeram compreender o porquê do mundo. A importância das civilizações fundadoras. Nas artes , nas leis, na religião, na economia, na arquitectura. Tudo. Fixei coisas improváveis. Coluna: base fuste e capitel. Entablamento: arquitrave, friso, cornija. Ordens dórica, jónica e coríntia. Romanas: toscana e compósita. E por aí fora. Os deuses todos. Ou quase. A minha cabeça, como se fosse Olimpo. A Grécia Antiga do helenismo. Minóicos e micénicos. Tudo cá dentro. Sem esforço.
Eu, em Roma, a rememorar isto tudo. Em cada esquina. Conhecimentos adolescentes à flor da pele. Ansiosa. Emocionada. O Coliseu, o Fórum. Os imperadores e os seus Arcos do Triunfo. Todos.Mas foi numa das salas dos museus capitolinos que os meus olhos mais brilharam! A capa do meu livro de História a três dimensões! Real. Carregada de significado. Lupa. A Loba. Ali, à minha frente. Lendária e tocável. Século V a.c. Mais real, só se o bronze etrusco respirasse!

[esse bronze resistente, sonoro e dúctil da "minha" Tabela periódica]


imagem: daqui [não consigo editar a que eu tirei :(]

As 3 super estrunfinas

Elas vestiram-se de azul! E a sorte não se fez rogada. A sorte e a competência técnica. Evidentemente! Mas nem a estrunfina é mais azul do que elas! Um dia, ainda vou saber falar de futebol como estas três grandes senhoras: Dalila, Sónia e Xana! Obrigada. Foi muito divertido! Aos estrunfes, também agradeço, claro :) Mas eles sabem sempre falar de futebol. De futebol e de... estrunfinas. De qualquer cor :)

domingo, maio 10

a noite pede música. esta!

Em tons de azul e vento




Está uma ventania! A minha árvore, verde, verde dança. Sem sair do lugar. A empanada já está no forno. Tamanho XL. Deve estar quase pronta. Pelo aroma que sai da cozinha e chega aqui, ao escritório. Ainda somos bastantes! A maioria portistas. Ferrenhos. E, lá no meio, um sportinguista. Altivo. Lúcido. E sofredor! O jogo, como sabem, é mais logo. A cidade, não fosse o vento e, agora, a chuva, poderia ouvir-se respirar. Está tudo quieto. Ainda mais quieto do que num domingo qualquer. Daqui a pouco olhos postos na televisão. E eu, confesso, de olhos a cirandar de rosto em rosto. E de vez em quando na televisão. Mas o melhor do jogo, para mim, é a cara deles, as expressões deles e, claro, os comentários da minha querida Dalila! Eu gosto destes jogos. Que nos reúnem na casa mais quente que conheço. Mais uma vez. E sempre.
Depois, a cidade despertará. Confio. Em tons de azul e vento.
E chuva.
Adenda: afinal, no grupo, há um Vitoriano... de Guimarães. Convicto e com um excelente sentido de humor!
Adenda nº2: afinal as queridas Sónia e Xana também são um espanto, a comentar o jogo! O que eu aprendo com elas! mais azuis do que a estrunfina!
imagens: Cristina Bottallo

Seria o amor português

[variações sobre um fado]

Muitas vezes te esperei, perdi a conta,
longas manhãs te esperei tremendo
no patamar dos olhos. Que me importa
que batam à porta, façam chegar
jornais, ou cartas, de amizade um pouco
- tanto pó sobre os móveis tua ausência.

Se não és tu, que me pode importar?
Alguém bate, insiste através da madeira,
que me importa que batam à porta,
a solidão é uma espinha
insidiosamente alojada na garganta.
Um pássaro morto no jardim com neve.

Nada me importa; mas tu enfim me importas.
Importa, por exemplo no sedoso
cabelo poisar estes lábios aflitos.
Por exemplo: destruir o silêncio.
Abrir certas eclusas, chover em certos campos.
Importa saber da importância
que há na simplicidade final do amor.
Comunicar esse amor. Fertilizá-lo.
«Que me importa que batam à porta...»
Sair de trás da própria porta, buscar
no amor a reconciliação com o mundo.

Longas manhãs te esperei, perdi a conta.
Ainda bem que esperei longas manhãs.
e lhes perdi a conta, pois é como se
no dia em que eu abrir a porta
Do teu amor tudo seja novo,
Um homem e uma mulher juntos pelas formosas
inexplicáveis circunstâncias da vida.

Que me importa, agora que me importas,
que batam, se não és tu, à porta?


Fernando Assis Pacheco, in Poemas de Amor, Antologia de Poesia Portuguesa,pg.195, Dom Quixote,2002

sábado, maio 9

a noite pede música

sexta-feira, maio 8

Legenda


Nada garante que tu existas
Não acredito que tu existas
Só necessito que tu existas
David Mourão-Ferreira
imagem: Antonina

Eu sugiro...

...que coloquemos um ponto final. Destes. No jantar. Eu mereço!
imagem: Miguel Coelho

O diabo veste...

... aliás, despe! Estaríamos numa reunião? Não tem a noção de que uma camisa branca faz milagres! E uma árvore de natal de marcas à vista, até doí! E o cabelo demasiado amarelo pode parecer uma esfregona. Mas não uma esfregona qualquer. Claro. Uma Vileda! E que adiantam os tacões do tamanho de um poste. Quando mesmo assim não se vê nada! Nem eloquência! E pergunta se estamos a ver, mil vezes. E nós a ver tudo. Tudinho. Tá ver? Tudo giro. Giríssimo!
Valha-me o Diário Económico. De ontem. Que explicou tudo. Como se eu fosse burra. Sobre o efeito da descida dos juros para 1% na prestação da casa. Há dias que custam mesmo a passar. Principalmente quando não se tem orçamento. E se anda de sabrinas.

Coisas que combinam comigo

Só para dizer que chegaram! Gosto TANTO. íSSIMO. Delas. E de conversas. Das boas. Quem diz boas, diz inteligentes. As cerejas? Maduras. E doces.

quinta-feira, maio 7

i*... o que é que Obama anda a ler...


Não lhe perguntei. Infelizmente. Mas alguém perguntou por mim. Dizem que é ÍSSIMO. Eu ainda não o li. Li, aqui, uma entrevista exclusiva com o Senhor Presidente. E li mais coisas. A correr. Ainda não vi a versão papel do novo diári*o. O design, assim, à primeira parece-me muito apetecível. Mas preciso ver com as mãos. E só depois poderei emitir a minha opinião. Para já, fiquei-me pelo on line. E dou-me por agradecida... porque o meu dia - nem vos digo nem vos conto - não fica por aqui, hoje! Aliás, isto vai piorar. Que, no caso, é como quem diz, melhorar!Sim, porque em época de crise, mesmo que tenhamos de trabalhar por três, temos de agradecer! E cá estou eu a fazê-lo. Sem nenhuma ironia. Apenas temo, porque gosto da vossa companhia, ter de me afastar. Por um período de tempo. A ver vamos.
De qualquer modo, o Grupo Lena está de parabéns. Com este novo jornal, criou 100 postos de trabalho, num sector que, ainda há uns meses, despedia aos magotes! Tomara que lhes corra tudo bem. E, sabem que mais, eu gosto do Grupo Lena. Estou à vontade para o dizer. Pois não tenho a mínima ligação às empresas. Nem sei exactamente quem são as pessoas. Mas, ao longo dos anos, por diferentes motivos tenho lido - como direi - sobre projectos que concretizaram em diversas frentes e, tenho para mim, que tem líderes de visão e acção. E são portugueses. E não só! Agora, não tenho tempo de explicar porquê. Mas estava capaz de abrir um Grupo Lena Fã Clube! Depois, com tempo, explico tim tim por tim tim!

* não é gralha... :) versão on line aqui

quarta-feira, maio 6

Se alguma vez eu tivesse vivido em Roma


Se alguma vez eu tivesse vivido em Roma, ou permanecido na cidade um período razoável, talvez este livro não fosse possível. Toda a gente sofre da síndrome de Lyautey: o marechal francês, nomeado governador de Marrocos nos primeiros anos do século XX, confessaria mais tarde que, no dia em que chegou, pensou escrever um livro; um mês depois, achava que tinha material para uma série de artigos de jornal; mas,ao fim de um ano, concluiu que não era capaz de produzir uma linha. Talvez isso aconteça com todas as cidades. Também Elias Canneti escreveu um livro admirável, impressionista e diverso, sobre Marraquexe;mas esteve lá umas semana e nunca mais voltou.
Para mais, Roma “é um arquétipo demasiado forte”, como disse Yves Bonnefoy: tudo, na cidade, é estímulo à escrita, tudo é recurso aos sentidos, tudo exalta a criatividade. Admirem-se as suas ruínas; mas admirem-se, como dizia Stendhal, “imaginando o que falta e abstraindo do que existe”. Percorram-se as suas igrejas; mas não se esqueça que elas nascem de uma pulsão religiosa sem paralelo. Visitem-se os seus museus; mas não deixemos que a pressão da quantidade nos gaste o olhar para aquilo que é essencial, as obras supremas casualmente alinhadas com as dos seus epígonos. E há as ruas, a beleza da gente, o seu bozear cantado, as cores, o clima, os jardins, os terraços debruçados do alto dos prédios sobre o vazio; e as laranjeiras, as mil e uma espécies de pinheiros, as azáleas e as magnólias, “faluas brancas num mar de verde carregado”, como escreveu o poeta Giuseppe Conte.
Este livro não descreve Roma: toma-a como pretexto para incursões em territórios que vivem comigo há muitos anos, seja o cinema italiano do pós-guerra ou a paixão da Tosca, a tragédia de Caravaggio ou a graça requintada de Rafael. E o meu longo fascínio, sempre ambivalente, pela arquitectura; o gosto pelas cenografias fantásticas de Bernini; a sugestão de uma grandeza impensável nas ruínas imperiais; o sonho de Adriano vazado nos restos da villa que fez construir nos arredores de Roma.Roma é uma tradição literária que conta mais do que se vê e uma tradição visual que nos mostra mais do que aquilo que qualquer literatura seria capaz de imaginar.
[...] A minha Roma, que só é a cidade que mais amo porque Lisboa não está a concurso, é muito mais do que aquilo que se dá neste livro. E o pouco que aqui está, se calhar, nem sequer o seria capaz de o escrever sobre Lisboa.
Às vezes, não estar lá é a melhor maneira de não se esquecer uma cidade. Este livro é um agradecimento, impessoal e indeterminado: viver faz todo o sentido, quando se conheceu Roma.


António Mega Ferreira [com fotografia de Clara Azevedo] in Roma, Pag. 131/133

imagem: Vista do Forum
[isto é até uma heresia quando este livro tem magníficas fotografias da Clara Azevedo]

Germano Silva na Comunidade de Leitores



Germano Silva é o próximo convidado da Comunidade de Leitores, uma iniciativa da livraria Almedina. Miguel Carvalho é o perguntador do costume. Desta vez, uma conversa entre jornalistas aberta a quem quiser participar e ficar a saber mais sobre o livro Porto: Sítios com História, editado pela Casa das Letras.
Como sempre, a iniciativa promove autores portugueses contemporâneos e permite, de forma intimista, uma conversa plena de curiosidades. Os bastidores do livro, as motivações, as entrelinhas e tudo o mais que se queira perguntar sobre a obra em questão!
No próximo Sábado, dia 9, na Almedina do Arrábida Shopping há mais uma conversa informal, desta vez sobre a cidade mais bela do mundo! Digo eu...assim como quem nunca o disse antes, aqui :) Excepcionalmente, o autor estará presente em ambas as sessões, 9 e 16 de Maio. Sempre às 17 horas.

Uma boa ideia, plena de emoção!

Não é apenas uma boa ideia! É sensibilizar com emoção! Muito, muito terno!

Roubei ao marcas d`água. com vénia, ao Paulo!

terça-feira, maio 5

Informação tipo pizza


É assim, mais ou menos, como escolher os ingredientes para a pizza! Ora eu quero uma notícia daqui, daqui e daqui. Eu, cá por mim, só escolhia as boas!
A iniciativa é da TIME. O conceito é MINE: my magazine, my way. Pode escolher até 36 ingredientes - perdão - páginas! Depois o que escolher ler, de todas as revistas do grupo, é-lhe enviado por mail. Os primeiros 30 mil leitores nos Estados Unidos, podem também receber a sua própria revista por correio. Uma forma de contrariar a máxima bad news, good news :)

Arriba, arriba!!!

Hoje, ao passear por aí recordei, num ápice, num comentário super divertido, o fabuloso Speedy Gonzalez. A minha geração lembra-se com certeza dele! Eu ficava colada à televisão. Vê-lo fazer tudo por um pedaço de queijo, a uma velocidade estonteante. Tão divertido! Mas ele, hoje, agora, veio aqui com um único propósito. Aliás, ele não vem de flor na mão por acaso! Fechem as luzes!

[Sonja, aceitas casar comigo?]

Paris num instante


Há imensos motivos para ir a Paris. Porque sim, por exemplo, é um. No entanto quem lá for, até 28 de Junho, poderá, caso aprecie o tema, ver a exposição que está no Musée du Quai Branly.

Le siècle du jazz propõe revelar a relação entre jazz e artes gráficas ao longo de todo o século XX. Fotografia, pintura, cinema e literatura celebram o jazz de uma forma original. Espreitem mais aqui. De onde também retirei as imagens.

Cafés do mundo - Greco

Tem mais de 200 anos. Fica na Via Condotti, 86. A rua das condutas que, noutros tempos, levavam a água até às termas de Agripa. Como sabem, é a rua onde se concentram as lojas dos mais prestigiados estilistas e marcas. No entanto, confesso, o que mais me encantou foi o Caffé Greco. As paredes forradas de História. Imagens de todos os nomes sonantes que passaram por lá.
Keats, Byron, Goeth, Pavece e outros tantos escritores. Liszt, Wagner e Bizet estão, também, entre os compositores que lá tomavam o pequeno-almoço ou bebiam um copo. As paredes estão forradas de memórias assim. E o piano preto, de cauda, num compartimento discreto, quase privado evoca sons eternos. Como a cidade.
Fundado em 1760, por um grego, o café tornou-se, como tantos outros, Europa fora, o lugar certo de muitos estrangeiros. Entre os seus frequentadores estão, ainda, Casanova e Luís II da Baviera.
Quem entra, percebe, de imediato, quem são os autóctones e quem são os turistas. Os turistas sentam-se, de nariz no ar, de olhos ávidos e estarrecidos e, só depois, fazem o seu pedido. A lista - listino dei prezzi in euro - tem um pouco de tudo! Um café expresso custa cinco euros. Um cappuccino ou um chá, sete. Um aperitivo ou um gelato, doze. O preço mais elevado da lista é o da champagne. Uma taça pode chegar aos 35 euros. Mas pelo ar feliz dos que lá estavam...
Os italianos de todos os dias ficam ao balcão, impecavelmente vestidos, a beber o seu expresso!
Roma. Roma. [suspiro] Dio, como ti amo!

imagem: café Greco

Vasco Granja - Uma vida mil imagens

Claro que estou triste! Ainda me recordo bem dele! Para mim, todos os desenhos animados do mundo, viviam em sua casa. Os dos países de Leste, Oeste, Norte e Sul. Todos, na casa do Vasco Granja. E quando ele aparecia era certo de que, com ele, apareciam imensos personagens afáveis como o seu sorriso. Tantas vezes o imaginei a ter grandes conversas com a Pantera Cor-de-Rosa, a minha preferida.

Durante um salão de Banda Desenhada, na Exponor, em 2003, Vasco Granja foi homenageado. Nessa altura a ASA editou um livro intitulado Vasco Granja - Uma vida mil imagens. Guardo com imenso carinho o livro que me autografou e as breves palavras que troquei com ele. Com o "pai adoptivo" da Pantera Cor de Rosa, como lhe chamei na altura. E Vasco Granja, não negou! Claro que estou triste!
Mais aqui.
imagem: Manuel de Sousa

segunda-feira, maio 4

a tua cadeira


eu não sabia que a luz se podia sentar no teu lugar.

dei conta hoje, quando na tua cadeira pousou a primeira luz da manhã.

eu não sabia como somos tão iguais quando se trata do princípio da vida.

e não sabia, ainda, que os nossos sonhos jamais se poderiam fundir

apesar de, um dia – eu sei que sim – termos acreditado que nos daríamos paz.

quem diz paz, diz amor.

eu não sabia que poderíamos ter sido um do outro. um.

um farol, apesar das intermitências, é sempre um sinal.

e eu também não sabia.

eu não sabia que se fosse ilha, em vez do mar que a circunda

podia, ainda, estar dentro do teu peito.

às vezes penso que estou.

mas deixo de acreditar.

tal como um ateu diante da vida. tal como um milagre diante de um ateu,

eu não sabia que tu, um dia, poderias vir ao meu encontro

com vontade de dançar.

eu gostaria que em vez da luz no teu lugar, ainda fosses tu.

dei conta, hoje, quando no meu coração se sentou, para ficar,

tanta ternura vivida, tantos anos depois do amor.

do amor sem nenhum adereço.

do amor silencioso como espuma.

tão silencioso como a ausência de luz

na tua cadeira.
imagem: Ana Rita Carvalho

Os cafés

OS ÓRFÃOS DOS CAFÉS

Tal como Borges escreveu um dia, eu poderia de igual modo dizer: «Nasci noutra cidade que também se chamava Lisboa».Borges diz que recorda o que viu e também o que os pais lhe contaram. Mas ele sabe que as nossas verdadeiras cidades são sempre as cidades da nossa infância. Por isso acrescenta: «sei que os únicos paraísos não proibidos ao homem são os paraísos perdidos. / Alguém, quase idêntico a mim, alguém que não terá lido esta página / lamentará as torres de cimento e o podado obelisco». A cidade de hoje será a infância de amanhã.Por tudo isto gosto imenso dos livros de Marina Tavares Dias. Com uma obstinação exemplar, ela tem vindo a reerguer a «Lisboa Desaparecida», isto é, a Lisboa da minha infância e sobretudo a Lisboa dos meus tempos de estudante, mas também a Lisboa dos meus pais e dos meus avós (com o tempo tudo se mistura, e regressamos todos à mesma pátria intemporal, à Lisboa fora do tempo, onde brincámos e aprendemos a amar). Associando a isto duas outras obsessões, mas a verdade é que as duas coisas não estão separadas: Sá-Carneiro e Pessoa, ligados aos cafés que eles frequentaram e aos lugares onde passearam e escreveram.Num desses livros envolvidos numa aura de bruma, Marina Tavares Dias restitui-nos agora «Os Cafés de Lisboa» (Quimera). Noutro dia Jorge Listopad escrevia que à saída do Teatro São João do Porto me tinha visto, no último café iluminado na noite da cidade, a escrever certamente a crónica para o dia seguinte. Não era por acaso. As crónicas escrevo-as sempre em computador. O resto (que se poderia dizer «o essencial», mas talvez isto nem sempre bata certo), escrevo-o à mão, em cadernos verdes ou azuis, nos cafés ensonados e friorentos que ainda existem pelo mundo fora.A verdade é que adoro cafés. E que tive em cafés alguns dos mais belos momentos de leitura, encontro, discussão, contemplação, escrita, estudo, violência de olhares, ternura das mãos, de que me posso lembrar. Nesses cafés que a Marina recorda no seu livro: o Monte Carlo, o Monumental, a Brasileira, o Palladium, ou, depois, a Grã-Fina, o Nova-Iorque, o Vává. E entre os motivos que tenho para gostar do Porto estão os cafés que ainda lá existem: cafés rodeados de noite e fumo, com velhos de unhas negras, prostitutas tristes, e adolescentes sufocando a tristeza num bolo de arroz e num leite quente.

Eduardo Prado Coelho
imagem: Manuel de Sousa
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a) [e não é saudades de ler Eduardo Prado Coelho porque isso, felizmente, eu posso fazê-lo sempre que me apetecer. é saudades de saber que podia ler uma crónica dele, no Público. é desse ritual que tenho saudades. desse momento em que começava a ler o jornal pela página onde estivesse a sua crónica]

b) [já há uns anos encetei uma pesquisa sobre os cafés do Porto. É um tema que me interessa muitíssimo. Se alguém tiver conhecimento de textos - por exemplo, assim, uma simples (e deliciosa) crónica como esta - é favor informarem-me. fico muito grata. obrigada. muito.]

domingo, maio 3

às vezes


Às vezes tenho medo de esquecer tudo:

a casa onde nasci, o recreio

da escola, essas vozes que lembram um copo de água

no verão.

Jorge Gomes Miranda in Anos 90 e Agora, pag.99, Quasi, 2001
imagem daqui

Menina da Ria para o Menino do Rio


Menina da Ria. Pois é! Aveiro está na voz de Caetano, logo, está no centro do mundo! Esta vai com dedicatória para o Eduardo que está nos Açores a caminho do Porto e, depois, segue para Aveiro! Dos deliciosos ovos moles, da Arte Nova e dos Moliceiros! O turismo já está atento. Claro! E aproveita a boleia! Mesmo com opiniões dispares. Uns gostam. Outros, não! Entretanto, Eduardo, a menina do rio - Douro - cá vos espera :)

Lisboa, a minha mãe e o Sporting

Esta música é para a minha mãe. Ela adora Carlos do Carmo. E suspira, de vez em quando, por Lisboa. Viveu lá. Estudou lá e, foi por lá, que se fez sportinguista! É verdade! Gosto de a ouvir contar histórias. Tanto! Há uma, de Lisboa, de que gosto especialmente por me parecer surreal! A minha mãe foi muitas vezes a Alvalade. Ela e os primos. Levados por um tio - padre - que era Deus no céu e o Sporting na terra! Tanto que - agora sentem-se, por favor, porque é verdade - quando o Sporting perdia, o tio Zé Luís, mandava retirar as cortinas das janelas, substituindo-as por panos pretos! A casa, diz a minha mãe, ficava um mausoléu. Já quando o Sporting ganhava ninguém lhe conseguia estancar a felicidade. Era o céu. A verde e branco! E é por isso que, ainda hoje, a minha mãe segue com devoção discreta e afincada o clube dos leões! Mas, graças a Deus, não muda as cortinas, sempre que o seu clube perde!

sábado, maio 2

...é tudo tão verdade!


Mãe! Vem ouvir a minha cabeça a contar histórias ricas que ainda não viajei!

Traz tinta encarnada para escrever estas coisas!

Tinta cor de sangue encarnada, sangue verdadeiro, encarnado!

Mãe! Passa a tua mão pela minha cabeça!

Eu ainda não fiz viagens e a minha cabeça não se lembra senão de viagens!

Eu vou viajar. Tenho sede! Eu prometo saber viajar.

Quando eu voltar é para subir os degraus da tua casa, um por um.

Eu vou aprender de cor os degraus da nossa casa. Depois venho sentar-me ao teu lado.

Tu a coseres e eu a contar-te as minhas viagens, aquelas que eu viajei, tão parecidas com as que não viajei, escritas ambas com as mesmas palavras.

Mãe! Ata as tuas mãos às minhas e dá um nó-cego muito apertado!

Eu quero ser qualquer coisa da nossa casa. Como a mesa.

Eu também quero ter um feitio que sirva exactamente para a nossa casa, como a mesa.

Mãe! Passa a tua mão pela minha cabeça!

Quando passas a tua mão na minha cabeça é tudo tão verdade!


Almada Negreiros
[mãe. amo-te. tudo.tanto. infinitos íssimos.para sempre.és linda. muito minha. mãe]

A Rosa Púrpura do Cairo




Diz assim, na contracapa do DVD:
«Um dos melhores filmes sobre filmes alguma vez feito» (Time Magazine), a Rosa Púrpura do Cairo, de Woddy Allen liberta-se da convenção do olhar cinematográfico para criar uma fábula mágica e "inebriante" sobre a vida, o amor, a ilusão e a esperança. (...) Mostra Allen "no pico da sua imaginação e compaixão, ao registar a magia do cinema em todo o seu esplendor.

Cecília encontra-se completamente viciada em filmes de Hollywood. Fascinada pelo seu novo filme favorito, A Rosa Púrpura do Cairo, fica espantada quando o protagonista (Tom) sai de repente do ecrã para a conhecer. Arrebatada pelo seu charme, Cecília apaixona-se por ele - até conhecer o actor real (Gil) que representa a personagem. Apaixonada simultaneamente por uma personagem de ficção e por um actor famoso, Cecília esforça-se para encontrar a fronteira entre a realidade e a fantasia, que tal como irá descobrir, encontra-se muitas vezes à distância de um sentimento».
Vi este filme, pela primeira vez, com vinte e poucos anos. Ontem, revi-o! E só o revi ontem, porque não havia forma de o encontrar em DVD. Agora, a fnac tem-no disponibilíssimo.
Deixo-vos com um excerto dos diálogos. Fabulosos e com muito humor. Um filme sempre a ver e rever. Digo eu! Entre o a cores e o preto e branco. Para nos situarmos entre ficção e realidade. Sem pipocas!

[Com Tom, a personagem do filme que se apaixona por Cecília e sai da tela do cinema para a ir buscar à sala do cinema ...e levá-la para dentro do ecrã...]

Cecília - Toda a vida quis saber como seria estar deste lado do ecrã.

Tom - Estás a ver a cidade a acordar? É toda tua.

Cecília - O meu coração está a bater tão depressa.

[Ele beija-a e, do outro lado da tela, ou seja, na vida real, aparece o actor (Gil) que representa a personagem e resolve ir até à sala de cinema vazia, mas onde o filme não pára de ser projectado]
Gil - Cecília!
Cecília - Gil, o que fazes aqui?

Gil - Vim aqui para pensar. E tu, o que fazes aqui?
Tom - Ela veio sair comigo. Podes deixar-nos em paz?

Gil - Não, não posso, tenho ciúmes.

Cecília - Tens ciúmes?

Gil - O que é que queres que diga? Não consigo esquecer-te.

Cecília - A sério, Gil?

Tom - Por favor, volta para Hollywood!

Gil - Tenho vergonha de admitir. Lembras-te de ter dito que tinha um brilho mágico? Mas és tu, tu é que o tens. E embora nos tenhamos acabado de conhecer, sinto que isto é verdadeiro.

Tom: Não podes gostar dela, ela gosta de mim.
Gil - Dá meia volta e entra para o filme.
Tom - Nunca mais volto para o filme.

[Entretanto, os restantes actores do elenco do filme que está na tela, observam a cena fora do ecrã e resolvem intervir]

Actor secundário - Não acredito nisto! Lá estão eles outra vez. Tom, volta para aqui.

Gil - Estás a ver Tom, estás a estragar tudo!
Tom - Tu é que estás!
Gil - Se não fosse eu, não existias.

Tom - Não estejas assim tão certo. Podia ter sido representado pelo March ou pelo Howard.

Actor secundário - Enganaste. O teu papel é muito insignificante para atrair uma estrela de renome.

Gil - Insignificante? Que raio de conversa é essa?
Tom - Não sou uma personagem de segunda!

Gil - Não penso em mais nada desde que nos conhecemos. Tenho de passar algum tempo contigo para te mostrar como é a vida quando duas pessoas se amam.

Cecília - A semana passada ninguém me amava, e agora duas pessoas gostam de mim e são a mesma pessoa.

Actor secundário - Fica com o verdadeiro. Nós somos limitados.

Outro actor secundário - Fica com o Tom. Ele não tem defeitos.

Outro actor secundário - Fica com alguém, porque isto está a ficar chato.

Tom: Ela vai ficar comigo. Estás a perder tempo.

Gil: Volta para o ecrã. Estou a tentar dizer à Cecília que a amo.
Tom: Eu amo-te, sou honesto, de confiança, corajoso, romântico e beijo bem.
Gil - E eu sou verdadeiro.
Actor secundário: Vá lá Cecília. Escolhe um, para acabarmos com isto. A maior característica humana é a possibilidade de escolha. [...]

Metamorfose


Para a minha alma eu queria uma torre como esta,

assim alta,

assim de névoa acompanhando o rio.


Estou tão longe da margem que as pessoas passam

e as luzes se refletem na água.


E, contudo, a margem não pertence ao rio

nem o rio está em mim como a torre estaria

se eu a soubesse ter...


uma luz desce o rio

gente passa e não sabe


que eu quero uma torre tão alta que as aves não passem


as nuvens não passem

tão alta tão alta


que a solidão possa tornar-se humana.



Jorge de Sena in Coroa da Terra, pag. 96, Publicações Dom Quixote
imagem: Duarte Monteiro

Uma tarde e uma tarte de limão

Uma tarde de limão, para o Pedro.


Uma tarte de limão para mim, por favor!

:) agora, sem enganos!

Imagens: primeira: T4Nocas/segunda: Miguel Coelho

sexta-feira, maio 1

Dolce far niente ou a arte de não fazer nada










E no Dia do Trabalhador, a arte de não fazer nada. Assim se intitula um livro que alguém me ofereceu, há uns anos, quando eu era workaholic! Deixo-vos com as palavras deste pequeno e delicioso livro que me levou, também, a conhecer o trabalho da fotógrafa Erica Leonnard, autora destas belíssimas imagens. Não deixem de espreitar o site. Vale bem a pena.
[...] Se ao menos o tempo parasse só um bocadinho, para nos deixar saborear os momentos mais simples da vida. [...] A Arte de não fazer nada pode ajudar a abrandar esta corrida contra-relógio. [...] Um guia prático para o descanso e a descontracção conduz-nos a um mundo onde "ser" é mais atraente do que "fazer".
As fotografias de Erica Lennard permitem-nos celebrar a ociosidade em todas as suas formas tentadoras. [...] A arte de respirar, de meditar, de tomar banho, de escutar, de esperar, entre outras, dão-nos informações úteis sobre a melhor forma de assobiar, de permanecer no momento presente, de dormir a sesta, de curar uma constipação, ou de observar o pôr-do-sol. [...] Os textos do livro são de Veronique Vienne. [Bom fim-de-semana!]

Para o diabo não entrar


Foi assim, à ultima da hora. O telefone toca e, então, que fazes. Nada de especial. E se fossemos jantar e fomos. Fomos ao Ernesto, na Rua da Picaria. E, sem marcação, estava mesmo ali uma mesa para dois, à nossa espera. Conversa, como as cerejas. Como sempre. Nunca nos falta. E no dia que nos faltar, um de nós morreu. É uma das cinco certezas da minha vida. Estreita e acolhedora, como a Rua da Picaria. Depois, mudamos de passeio e fomos ao Rosa Escura. E as Maias nas portas, e nas caixas de correio antigas. As que resistem. «Para o diabo não entrar». E sorrimos. Ainda não era meia-noite. Como manda a tradição. As giestas floridas, no coração da cidade, a repetirem gestos e crenças ancestrais. Como se tudo fosse um eterno retorno.
Bebemos chá, no Rosa Escura. E eu, armada em resistente, fiquei-me pelo chá. E não pedi a tarte de limão. Depois, chegou a Cláudia e as estórias da semana em Bordéus, no château. Para a semana, regressa. E haverá mais estórias divertidas sobre o Pavel, a Maria da Luz e o grupo que lhe calhou em sorte. E depois, levamos a conversa para casa. Para o sofá. E eu, a pensar na tarte de limão do Rosa Escura. Exactamente da mesma cor das giestas floridas na boca das caixas do correio. Sim, Oscar Wild, devia ter cedido!

imagem: daqui