E a cor dum navio em movimento
E como ave, ficar parada a vê-la
E como flor, qualquer odor no vento.
Basta-me a lua ter aqui deixado
Um luminoso fio de cabelo
Para levar o céu todo enrolado
Na discreta ambição do meu novelo.
Só há espigas a crescer comigo
Numa seara para passear a pé
Esta distância achada pelo trigo
Que me dá só o pão daquilo que é.
Deixem ao dia a cama de um domingo
Para deitar um lírio que lhe sobre.
E a tarde cor-de-rosa de um flamingo
Seja o tecto da casa que me cobre
Baste o que o tempo traz na sua anilha
Como uma rosa traz Abril no seio.
E que o mar dê o fruto duma ilha
Onde o Amor por fim tenha recreio.
Natália Correia in Poesia Completa, Publicações Dom Quixote, 1999
4 Comments:
E é o que queremos, ser o recreio :)
Comecei a ler o poema (que não conhecia) já com vontade de o desfazer. À medida que o ia lendo, contudo, ia engolindo a minha vontade escárnio e mal dizer. Ora aqui está um poema digno desse nome - ia eu pensando. Tão distante do comum alinhar de frases sem significado que tanto se cultiva na poesia de todos os tempos. Depois, cheguei ao fim e, agradavelmente surpreendido, fui ver quem era o autor: Natália Correia. Curvo-me diante da senhora. Este poema honra a literatura. E a língua portuguesa.
cs :)
oh Professor!!!! de acordo...
qual de nós está com febre?
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