quinta-feira, dezembro 1
E os livros...
Escrito/editado por Marta 0 Terráqueos
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sábado, novembro 19
«há a lista dos dias, como o índice numa obra»
«há a lista dos dias, como o índice numa obra» [Maria Gabriela Llansol]
Eis os velhos e a sua ementa nostálgica: a lista dos dias com ligações habituais a determinados sentimentos.
A vida como obra individual que escapa ao controlo do artista alheio que vem esculpir a sua vontade efémera sobre o nosso percurso.
Obra individual que respira e não só. Eis estar vivo.
Gonçalo M. Tavares in Breves notas sobre as Ligações, pag.17, relógio d'água, 2009
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quinta-feira, novembro 17
«a corrida quieta da leitura» [Maria Filomena Molder]
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quarta-feira, novembro 16
sexta-feira, setembro 2
Um poema não é uma coisa...
Os homens não se medem pelos poemas que leram, mas talvez fosse melhor. O que é a fita métrica comparada com algo intenso? Há poemas que explicam trinta graus de uma vida e poemas que são um ofício de demolição completa: o edifício é trocado por outro, como se um edifício fosse uma camisa. Muda de vida ou, claro, muda de poema.
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quarta-feira, março 16
Às vezes tenho medo, muito medo.
imagem: Claudia Pinto
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quarta-feira, março 9
A biblioteca do Senhor Juarroz
O senhor Juarroz gostava de organizar a sua biblioteca de maneira secreta. Ninguém gosta de revelar segredos íntimos.
O senhor Juarroz primeiro organizara a biblioteca por ordem alfabética do título de cada livro. Rapidamente, Porém, foi descoberto.
O senhor Juarroz organizou depois a sua biblioteca por ordem alfabética, mas tendo em conta a primeira palavra de cada livro.
Foi mais difícil, mas ao fim de algum tempo alguém disse: já sei!
A seguir o senhor Juarroz reordenou a biblioteca, mas agora por ordem alfabética da milésima palavra de cada livro.
Há no mundo pessoas muito perseverantes, e uma delas, depois de muito investigar, disse: já sei!
No dia seguinte, assumindo este jogo como decisivo, o senhor Juarroz decidiu arrumar a biblioteca a partir de uma progressão matemática complexa que envolvia a ordem alfabética de uma determinada palavra e o teorema de Godel.
Assim, para estranheza de muitos, a biblioteca do senhor Juarroz começou a ser visitada, não por entusiastas da leitura, mas por matemáticos. Alguns passaram tardes a abrir os livros e a ler certas palavras, utilizando o computador para longos cálculos, tentando assim encontrar a todo o custo a equação matemática capaz de desvendar a organização da biblioteca do senhor Juarroz. Era, no fundo, um trabalho de descoberta da lógica de uma série, semelhante a 2 1 9 1 30 1 93
Pois bem, passaram dois, três, quatro meses, mas chegou o dia. Um reputado matemático, completamente vermelho e eufórico, segurando, na mão direita, um bloco gigante coberto de números, disse: Já sei! E apresentou depois a fórmula da série que baseava a organização da biblioteca.
O senhor Juarroz ficou desanimado e decidiu desistir do jogo. Basta!
No dia seguinte pediu à sua esposa para organizar a biblioteca como bem entendesse. Por ele estava farto.
Assim foi. Nunca mais ninguém descobriu a lógica da organização da biblioteca do senhor Juarroz.
Gonçalo M. Tavares in O Senhor Juarroz
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terça-feira, fevereiro 8
...é por estas e por outras...
Gonçalo M. Tavares, in Mil Folhas, Público, 2005
[...que o acho um grande Senhor. Tal e qual os Senhores que escreve...]
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terça-feira, janeiro 4
Alguma delicadeza
A mulher é certamente um elemento humano fora do comum: as casas só não envelhecem porque ela existe. Um cuidado feminino suporta a construção (como o cimento). Uma casa só não cai, se dentro dela existir alguma delicadeza.
Gonçalo M. Tavares in Uma Viagem à Índia
Escrito/editado por Marta 5 Terráqueos
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segunda-feira, novembro 22
O coração necessita de afinação, como os rádios
O coração necessita de afinação, como os rádios.
Por vezes, em simultâneo, executamos duas canções,
e uma perturba a outra,
e não é bom para os ouvidos.
Mas qual o botão que afina o coração?
...Não é assim tão fácil.
Gonçalo M. Tavares
Escrito/editado por Marta 4 Terráqueos
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Aprender a Rezar na Era Técnica
«Acabo de saber. Gonçalo M. Tavares, com o seu romance Aprender a Rezar na Era da Técnica vence em França o Prémio do Melhor Livro Estrangeiro 2010. O livro já havia sido, no início deste mês, um dos cinco finalistas dos Prémios Féminin e Médicis. O romance agora eleito como o melhor livro estrangeiro publicado em França em 2010 (na tradução de Dominique Nédellec «Apprendre à prier à l’ère de la technique ») foi publicado em Portugal em 2007.»
Isabel Coutinho
Fonte: aqui
Escrito/editado por Marta 0 Terráqueos
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terça-feira, novembro 2
"Aproximo-me apenas daquilo que admiro"
«O escritor tem uma responsabilidade, não apenas em relação ao momento presente e ao que aí vem, mas, antes de mais, em relação ao passado. As gerações passadas deixaram-nos muitos sinais. É responsabilidade do escritor contemporâneo estar atento aos sinais que os escritores clássicos nos deixaram...»
«"Os Lusíadas" é uma obra fabulosa, de uma grande riqueza; e ainda hoje dá enorme prazer ficar diante daquilo que percebemos que não envelhece. O meu prazer na leitura, ainda mais em relação aos clássicos, é, acima do mais, estético, e não ideológico...»
«"Uma Viagem à Índia" acompanha passo a passo, fragmento a fragmento, por vezes linha a linha, os conflitos físicos, os relatos sobre o passado, os tumultos, os enganos, as entradas em cena do narrador, etc, de "Os Lusíadas".»
«A experiência tem um forte valor moral e intelectual. Mas a modernidade alterou um pouco o valor e os termos dessa experiência. Classicamente a experiência pressupunha deslocação física. Se possível, a grande viagem. Na modernidade, a experiência é muitas vezes mental e, neste sentido, esta epopeia ou anti-epopeia é muito mais mental do que física.»
«Uma personagem sem qualidades, mas em queda. E o que parece é que é uma personagem que se entedia com a queda. Não tem medo, não fica desesperado, não faz um balanço último da sua vida. Não passa tanto por questões políticas, colectivas, por eventuais falhanços ideológicos ou do capitalismo. É muito mais uma questão centrada no indivíduo. O grande movimento do século XXI parece-me, é o da queda.»
«A tradição romântica do amor coloca-o numa espécie de círculo em redor de duas declarações - amo-te/eu também te amo ou amo-te/não te amo - e estas duas declarações impõem-se a tudo o resto: o mundo desaparece. Esta embriaguez não permite o desvio do olhar, nem a desatenção mínima. E estarmos obcecados por uma parte é estarmos desatentos a tudo o resto.»
Escrito/editado por Marta 4 Terráqueos
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sábado, outubro 23
Também o quero...
A vida, meu caro, é ilegível. Acontece
e desaparece. Não há inteligência
que a descodifique: vem em linguagem-nada,
surge no corpo como surge o dia, e como
se dia e vida individual fossem materiais paralelos.
...A vida não surge em prosa
nem em poesia — e a existência não fala
inglês, apesar de tudo. A natureza dos acontecimentos
resiste às invasões matreiras da publicidade e
dos filmes. Já não é mau.
Gonçalo M. Tavares, in Uma Viagem à Índia
Escrito/editado por Marta 1 Terráqueos
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sábado, outubro 9
Há exercícios para treinar a verdade
Há exercícios para treinar a verdade como, por exemplo, ter medo. Ou então ter fome. Depois restam exercícios para treinar a mentira: todos os grupos são isto, e todos os negócios. Estar apaixonado é a outra forma de exercitar a verdade.
Escrito/editado por Marta 11 Terráqueos
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segunda-feira, setembro 6
Um barulho que se mantém enquanto alguém o lê
[...]
Os jornais, por via das notícias, produzem um barulho fixo. Um barulho que se mantém enquanto alguém o lê. Mas na notícia acontece isto:os sofrimentos individuais e as alegrias íntimas desaparecem, tudo se torna propriedade colectiva: o jornal como teoria geral da inexistência do indivíduo. Só existe pessoa-acontecimento se existir pessoa-espectador: a privacidade absoluta, verdadeira, a individualidade pura, não são acontecimentos, são não-acontecimentos, isto é, à letra: a individualidade (a de zero espectadores) não acontece. Quase que se poderia afirmar que a existência individual e privada será uma invenção, precisamente individual. Como provar a existência de momentos puramente íntimos, não testemunhados por nínguém, a não ser pela consciência do próprio? Não podemos provar, só acreditar. Acredito que o outro existe enquanto indivíduo, acredito: crença; não sei: não é um conhecimento. Mas de mim próprio sei: conheço os meus momentos individuais, e apenas posso esperar que os outros acreditem na existência de tal coisa. Toda a parte da nossa vida que é testemunhada constitui o modelo do jornal: vejam o que acontece ou aconteceu. E só existe na História. E o que fica de fora são os indivíduos. [...]
Gonçalo M. Tavares in Um Homem: Klaus Klump, pag. 115, Caminho, 2003
imagem: Crete. Chania. 1962. Man reading newspaper. © Costa Manos/Magnum Photos
Escrito/editado por Marta 1 Terráqueos
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