Há nomes mágicos, dizias tu, falando-me de lugares, pessoas, coisas: berlinde, Sara, Abril, concha ou jardim. Eu acrescentava: arca d`água, lembrando-me de um parque, altos plátanos, a continental cidade do Porto, azulejos amarelos entre o granito enegrecido pelos fumos.
As «ilhas» fugiam, numa paisagem de corredores estreitíssimos, celhas com a roupa da barrela, crianças e galinhas esgravatando a terra, humidade onde crescia o bolor e trepavam cogumelos. Arca d`Água ficava longe do centro e do rumor dos cafés. Alguém chorava junto a um dos plátanos.
Era um lugar de encontros clandestinos onde se trocavam pequenos jornais e palavras a meia-voz; onde se inventava a esperança desses dias. […]
Há nomes mágicos, insistias. Eu voltava a falar-te na Arca d´Água, como se pudesse, com qualquer abracadabra, atrair o espírito do lugar, o génio da lâmpada, o «abre-te Sésamo» para, desta vez, sair da caverna e ver a Luz.
Na ampla praça os plátanos moviam-se num soneto de Sena. As lâmpadas acendiam-se mais perto, rasgando o nevoeiro que rosnava nos telhados e já chegava às soleiras das portas. Era outro Dezembro, outra praça, outra vontade. […]
Eduardo Guerra Carneiro in Colectânea de Poesia sobre o Porto, Dom Quixote, 2001
imagem: Teresa Teixeira
sexta-feira, setembro 10
Arca D´Água
[para ti, R., com toda a ternura de que sou capaz.
hoje.]
Escrito/editado por Marta 10 Terráqueos
Etiquetas: Eduardo Guerra Carneiro, Escritores, Porto
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