
Quando estou longe e a minha voz, à primeira sílaba, te dá as coordenadas do meu coração;
Quando - choras antes aqui. estou à tua espera, faço-te um chá;
Quando - vou ter contigo, temos de brindar, o momento é único;
Quando no meio da conversa me dizes - ah, é verdade, tens de ler isto, vais adorar;
Quando me trazes um doce, de qualquer lugar - esquece a dieta;
Quando me escreves uma carta [de envelope e selo] a contar as férias e a contar-te a ti;
Quando - estou apaixonado, ela é linda, estás a ver... assim como... lembras-te...;
Quando - anda daí, vamos às compras;
Quando - vais lá cozinhar, divides a cozinha com o João;
Quando vais viajar e - dá de comer ao gato; olha a água, a porta, o alarme;
Quando sonhamos alto - um dia os nossos filhos vão brincar juntos;
Quando palmilhamos a geografia das nossas infâncias, para que nada nos falte;
Quando tomamos café e são cinco minutos uma tarde inteira;
Quando partilhamos todas as histórias de que somos feitos e, ainda, a tarte de maça;
Quando filmes, livros, tupperwares e tabuleiros andam por nossas casas, como se fossem uma;
Quando descobrimos que, afinal, fomos separados à nascença e, por dentro, nem a mãe nos distingue;
Quando ligas a banda sonora das nossas viagens, estrada fora, noite adentro;
Quando se faz mais um silêncio cúmplice ou inventamos um sorriso novo;
Quando a paz de nos termos é o cordão umbilical que nunca cortamos;
Quando se me esquecer, poderás dizer quem sou - o bom e o mau;
Quando dentro do nosso abraço estamos para sempre;
É aí, exactamente aí, nesse pilar monossilábico que assenta o lugar mais acolhedor da minha gramática de afectos. Nós, é o pilar e o lugar. O pronome pessoal tónico que me faz sentir em casa. Que me fará chegar sem nunca partir. Partir, sem nunca me afastar.
[participação na tertúlia virtual]
imagem: daqui